Autores: Rui A. Gomes e Miguel Galvão Teles *Grande parte da riqueza mineral do Mar de Timor está localizada no chamado Timor Gap. Estimativas sobre o seu valor variam, mas as três principais reservas petrolíferas no Gap — Sunset, Bayu-Udan e Elang-Kakatua (ver mapa) — contêm um total previsto de 500 milhões de barris, no valor de 17 mil milhões de USD a preços actuais (The Economist, 02/10/2000). Só Bayu-Undan contém reservas recuperáveis estimadas em 400 milhões de barris de petróleo bruto e de LPG, e 3,4 triliões de pés cúbicos de gás natural (Dow Jones 27/06/2000). Estas projecções suportariam uma produção de petróleo de aproximadamente 110 mil barris por dia (ver site http://www.nt.gov.au/ord). Calcula-se a duração das reservas para 25 anos, iniciando-se a exploração em 2003, e gerando lucros na ordem dos 300 milhões de USD por ano, provenientes de direitos de exploração e impostos (Phillips Petroleum Company 12/03/1999).A divisão das receitas resultantes dos direitos de exploração na área A da Zona de Cooperação — onde está localizada a quase totalidade das reservas — são actualmente de 50% para cada lado. Apesar de diminutos em comparação com os padrões da Arábia Saudita, os lucros resultantes dos direitos de exploração e impostos serão de importância capital para uma pequena e nova nação de apenas 800.000 habitantes. A chefe da missão em Díli do Banco Mundial, Sarah Cliffe, afirma que estas receitas representariam seis vezes mais o actual orçamento de Timor Leste e o suficiente para impulsionar uma taxa de crescimento anual de 15% durante 9 anos (Bussiness Week, 30/10/200).
Mais-valias petrolíferas e problemas de desenvolvimento.
Partindo do princípio de que a Austrália irá conceder 90% das receitas para Timor Leste, isto traduzir-se-á em mais de 100 milhões de USD por ano, a preços correntes, um montante que ultrapassa em quatro vezes o actual PIB timorense. Defendemos aqui, no entanto, que a economia de Timor Leste — com todos os seus problemas — terá de basear-se na ausência das mais-valias geradas pelo petróleo. Auty (1994: 12), por exemplo, considera que “as economias de base mineral têm sofrido de uma baixa performance quando comparadas com países de tamanho e grau de desenvolvimento económico similar mas sem este ‘bónus mineral’”. A experiência de vários países que viveram um boom petrolífero confirmam que as mais-valias obtidas resultam no aumento da procura de bens e serviços não transaccionáveis e com a redução do sector transaccionável, no desinvestimento agrícola, no aumento da desigualdade de rendimentos e num reforço da pressão para a manutenção de empregos no sector público, em função do aumento das receitas minerais. Com o aumento dos preços dos bens não-transaccionáveis e do reforço dos lucros em divisas externas, é forçada uma valorização da moeda, o que por sua vez reduz os incentivos à produção de bens exportáveis. Efectivamente, os países recentemente industrializados (NIC) do Sudeste Asiático — Coreia, Taiwan, Singapura e Hong-Kong —, de escassos recursos naturais, têm sido mais bem sucedidos que os países ricos em petróleo, como a Venezuela, México e Nigéria, que faliram (Sachs e Werner, 1995). A Nigéria representa um caso dramático de políticas erradas, ou seja, a parte não-petrolífera do PNB desceu de 9,2% no ano anterior ao boom, para 5,3 durante o boom. Grande parte do desânimo perante o desempenho agrícola na Nigéria tem-se baseado no aumento acentuado da importação de cereais à medida que o consumo total aumentou (Scherr, 1989; Roemer, 1994).Timor Leste poderá querer, temporária ou permanentemente, emular a experiência de países menos favorecidos da Ásia Oriental, desenvolvendo bens não-minerais para suster elevadas taxas de crescimento. No entanto parece improvável dada a fraca economia, caracterizada por uma base industrial primitiva, a falta de infra-estruturas, capital humano e instituições, resultantes de décadas de subdesenvolvimento, tanto sob a administração portuguesa como sob a indonésia. Nestas circunstâncias, as receitas provenientes do Timor Gap poderiam ser usadas pelo futuro governo como despesas de desenvolvimento, de forma a criar as infra-estruturas necessárias, desde obras públicas e projectos de irrigação a subsídios para fertilizantes, educação e saúde para os cidadãos.Estas mais-valias poderão adiar reformas e os governos tendem a substituir as suas políticas por comportamentos de procura de rentabilização e por corrupção. Por exemplo, Leite e Weidman (1999) confirmam que a corrupção está associada à abundância de recursos e à travagem do crescimento económico. De acordo com os mesmos, a corrupção diminui a taxa real de rendibilidade dos projectos, reduzindo consequentemente os níveis de investimento. Um aumento de corrupção também afecta directamente a despesa pública, visto os gastos com a educação e segurança social tenderem a diminuir. Da mesma forma, Mauro (1995, 1997) argumenta que o alastrar da corrupção no sector público (uma vez que as receitas geradas a partir de activos naturais tendem a estar sujeitas a regulamentação estatal) não só desencorajam o investimento como também limitam o crescimento económico. O nível de corrupção tende a piorar quando as instituições são fracas, a instabilidade política se mantém e os funcionários públicos são gananciosos. Por sua vez as elites têm a possibilidade de se aproveitarem das suas posições políticas para expropriar uma parte desproporcionadamente grande da riqueza proveniente de recursos naturais, o que promove a polarização social e desigualdades remuneratórias. Não deve haver, da parte dos timorenses, qualquer ilusão quanto ao facto de que fenómenos similares aos que se deram noutros países ricos em petróleo não venha a acontecer em Timor Leste.